Ela sempre gostara muito de observar as pessoas. Tem quem chamasse isso de hobby, de mania, ou de qualquer outro nome que tivesse na moda, mas o que ela gostava mesmo nunca foi de nomear, mas sim de observar. E dentro de suas observações, claro, haviam diversas classificações e mais outros milhares de nomes, neologismos, análises, crenças e verdadeiros contos envolvendo pessoas que simplesmente passavam, iam, e efemeramente saiam de sua vida.
Mas, aquele dia foi diferente, sem que ela notasse, parada, diante de sua cinzenta portaria, eu passei a observá-la, e não só isso, eu me encantei com essa observação. Sempre fui desligado, desleixado e havia quem dissesse, perdido. Mas, hoje, de alguma forma, eu havia encontrado um motivo para deter minha atenção a um par de olhos negros e um sorriso gigantesco. Sem que soubesse, minha atenção havia se voltado praquela garota parada naquela portaria a mexer naquele celular.
E eu observei, e eu fiz o que ela sempre gostou, e me atrevi a designar qualidades e histórias para aquela moça. Como nunca fui de realidades e como meu pai sempre me disse, vivo de passado, imaginei um passado próspero e muito remoto em que nós dois vivíamos felizes.
Eu era o maior, eu era o rei da vizinhança, minhas gudes eram invencíveis, e ela era a filha que toda mãe havia pedido a Deus. Estudiosa, cozedeira, educada, gentil e muito inteligente e determinada. E nós crescíamos. Nossa vida era tranqüila, e nosso bairro era agradável. Mas a segunda guerra chegou, e com ela, seus males. Vi minha mãe se desesperar, e vi a mãe dela parar de notar sua perfeição e entregar-se à bebida. Já era um homem à essas alturas, meus doze anos tinham um peso absurdo, era hora de agir.
Fui em sua casa, e roubei-a pra mim. Fomos de camelo para a Índia, onde lá, seriamos felizes. Ah, como ela era linda, e eu sabia que com ela eu seria feliz pra sempre. Meu Deus, como aquilo era tudo que eu precisava. Eu sabia que com ela eu seria completo, eu era o homem mais realizado do mundo e não havia nem sinal de espinhas em meu rosto!
Com o fim da guerra, recebi um e-mail da minha mãe, contando que nosso bairro havia sido comprado por uma máfia de meias-soquete e não era seguro voltar. Não podia ser mais ideal! Fomos para Bali, surfar e aproveitar o verão de setembro. Céus, como ela ficava linda ao sol. Eu sabia que ela sabia o quanto eu a amava. Dentro de mim, todo o meu amor era dela, e fora de mim também. Ela era meu bichinho de pé com cachinhos dourados e olhos de ameixa. Eu sabia que havia força em seu sorriso, e doçura em suas mãos, e ela sabia que eu sabia disso. Ela sabia de tudo e de tanta coisa, era tão genial.
Finalmente, bronzeados e cheios de compras, voltamos pra casa, sua mãe havia largado a bebida e agora era uma cantora de ópera renomada, e seu pai tocava harpa em festas diplomáticas. E ela agora era uma bailarina muito famosa. Seus pés sustentavam quatro carros populares dentro de uma sapatilha e sua mão fazia aquela conchinha do ballet sem entortar um dedo sequer. E eu agora era herói, e meu cavalo só falava inglês.
Quando comecei a pensar sobre nossos filhos um longo carro cor de vinho estacionou diante de seu prédio e buzinou, será que a levaria de mim? Não era possível! Não! Não seria capaz de tamanha maldade!
Seria, e levou. Vi de relance seu lindo sorriso partir e seus cachinhos abandonarem meu campo de visão. Mas não me desesperei, continuei meu caminho, pois sabia que íamos voltar a nos ver. Afinal, temos filhos para criar e uma história linda a viver. Eu sei que ela sabe que eu sou o grande amor da sua vida, e agora só falta eu me apresentar, e isso não vai demorar. :)
terça-feira, 24 de junho de 2008
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6 comentários:
Vive quem sonha e quem te conhece.
Te amo demais e obrigada pelas risadas que você me oferece toda vez que passo aqui.
(:
Lindo texto.
encantador!
Adorei
Ameeeei =)
muito booom !
hoje eu tô acreditando nele mais do que nunca na minha vida :)
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